quarta-feira, 26 de maio de 2021

HANTAVIROSE

O que é hantavirose?

A Hantavirose é uma zoonose viral aguda cuja infecção em humanos pode se manifestar sob variadas formas, desde uma síndrome febril até quadros mais característicos, como febre hemorrágica com síndrome renal (FHSR), que ocorre no território eurasiático, e a síndrome cardiopulmonar por hantavírus (SCPH), presente no continente americano.



No Brasil, se apresenta na forma da Síndrome Cardiopulmonar por Hantavírus. Na América do Sul, foi observado importante comprometimento cardíaco, passando a ser denominada de Síndrome Cardiopulmonar por Hantavírus (SCPH). Os hantavírus possuem como reservatórios naturais alguns roedores silvestres, que podem eliminar o vírus pela urina, saliva e fezes. Os roedores podem carregar o vírus por toda a vida sem adoecer. A hantavirose é causada por um vírus RNA, pertencente à família Bunyaviridae, gênero Hantavirus.

Nas Américas, a hantavirose se manifesta sob diferentes formas, desde doença febril aguda inespecífica, até quadros pulmonares e cardiovasculares mais severos e característicos, podendo evoluir para a síndrome da angústia respiratória (SARA).

A SCPH foi identificada pela primeira vez, nas Américas, nos Estados Unidos da América (EUA), em 1993. No mesmo ano, no Município de Juquitiba, interior de São Paulo, um surto da doença acometeu três pessoas de uma mesma família, com taxa de letalidade de 67,0%.


Sintomas

Na fase inicial, a Hantavirose causa os seguintes sintomas:

•  febre;

•  dor nas articulações;

•  dor de cabeça;

•  dor lombar;

•  dor abdominal;

•  sintomas gastrointestinais.


Na fase cardiopulmonar, os sintomas da hantavirose são:

•  febre;

•  dificuldade de respirar;

•  respiração acelerada;

•  aceleração dos batimentos cardíacos;

•  tosse seca;

•  “pressão baixa”.

IMPORTANTE: Nessa fase, também é possível surgir edema pulmonar não cardiogênico, com o paciente evoluindo para insuficiência respiratória aguda e choque circulatório.


Transmissão

A infecção humana por hantavirose ocorre mais frequentemente pela inalação de aerossóis, formados a partir da urina, fezes e saliva de roedores infectados. As outras formas de transmissão, para a espécie humana, são:

•  percutânea, por meio de escoriações cutâneas ou mordedura de roedores;

•  contato do vírus com mucosa (conjuntival, da boca ou do nariz), por meio de mãos contaminadas com excretas de roedores;

•  transmissão pessoa a pessoa, relatada, de forma esporádica, na Argentina e Chile, sempre associada ao hantavírus Andes.

O período de transmissibilidade do hantavírus no homem é desconhecido. Estudos sugerem que o período de maior viremia seria alguns dias que antecedem o aparecimento dos sinais/sintomas. Já o período de incubação do vírus, ou seja, o período que os primeiros sintomas começam a aparecer a partir da infecção, é, em média, de 1 a 5 semanas, com variação de 3 a 60 dias.


Reservatórios

Os hantavírus, em particular, são transmitidos especificamente por roedores silvestres da ordem Rodentia, família Muridae e Cricetidae. As subfamílias Arvicolinae e Murinae detêm os principais reservatórios primários da FHSR, enquanto que os da subfamília Sigmodontinae, da família Cricetidae, são os roedores envolvidos com a SCPH. 

Oligoryzomys microtis

Cada vírus, geralmente, está associado somente a uma espécie específica de roedor hospedeiro. Nesses animais a infecção pelo hantavírus aparentemente não é letal e pode levá-los ao estado de reservatório por longos períodos, provavelmente por toda a vida. No entanto, outras espécies de roedores pertencentes a outras subfamílias podem se infectar, sem se constituírem em reservatórios importantes para a transmissão do hantavírus.

Principais hantavírus, distribuição geográfica, reservatórios e patogenia no Brasil:

Vírus

Distribuição

Reservatório

Enfermidade Humana

Araraquara

São Paulo

Necromys lasiurus

SCPH

Castelo dos Sonhos

Pará

Oligoryzomys utiaritensis

SCPH

Juquitiba

São Paulo

Oligoryzomys nigripes

SCPH

Anajatuba

Maranhão

Oligoryzomys fornesis

Desconhecida

Rio Mearim

Maranhão

Holochilus sciurus

Desconhecida

Laguna Negra

Porto Alegre

Calomys aff. callosus

SCPH

Jaborá

Santa Catarina

Akodon montensis

Desconhecida

Rio Mamoré

Amazonas

Oligoryzomys microtis

Desconhecida

Fontes: (BONVICINO, 2008; TRAVASSOS, 2008; OLIVEIRA, 2007; ELKHORY; WADA et al., 2005; ENRIA, 2003; 
LEVIS, 2004)
Obs.: Febre Hemorrágica com Síndrome Renal – FHRS e Síndrome Cardiopulmonar por Hantavírus – SCPH

Na região Nordeste, tanto no caso do Rio Grande do Norte quanto no da Bahia, não aconteceu a investigação ecoepidemiológica, de forma que os reservatórios são até o momento desconhecidos. No Maranhão, foram identificados dois tipos específicos de hantavírus, associados a dois diferentes reservatórios: Holochilus siureus e Oligoryzomys fornesi.  Foi detectada na região do médio norte do estado do Mato Grosso a circulação do hantavírus Laguna Negra, variante essa que está associada ao roedor Calomys aff. Callosus e ao reservatório da variante Castelo dos Sonhos, roedores da espécie Oligoryzomys utiaritensis. 

A variante Castelo dos Sonhos foi identificada inicialmente em paciente proveniente do estado do Pará e é a responsável pela ocorrência de casos de hantavirose neste estado. 

Os diversos hantavírus conhecidos até o momento seguem a distribuição geográfica dos seus respectivos reservatórios. A casuística dos casos e a distribuição geográfica dos roedores positivos delineiam para o Brasil uma rota de ocorrência de casos de SCPH, provavelmente causados por diferentes hantavírus e associados a espécies de roedores reservatórios distintos.


Fatores ambientais

Diversos fatores ambientais estão associados com o aumento no registro de casos de hantavirose, e estão ligados ao aumento da população de roedores silvestres como, o desmatamento desordenado, a expansão das cidades para áreas rurais e as áreas de grande plantio, favorecendo a interação entre homens e roedores silvestres.

Situações de risco para infecção por hantavírus:

•  Limpeza de locais fechados, contaminados;
•  Atividades de lazer em locais rurais ou silvestres (ecoturismo);
•  Atividades ocupacionais realizadas em área rural ou silvestre (aragem, plantio ou colheita em campo, treinamento militar a campo, pesquisas cientificas);
• Fatores ambientais que provoquem o deslocamento de roedores para as residências ou arredores (queimadas, enchentes, alagamentos);
• Mudança no perfil agrícola ou outros fenômenos naturais periódicos que alterem a disponibilidade de alimentos para os roedores (floração das taquaras).


Diagnóstico

Atualmente, os exames laboratoriais para diagnóstico específico da hantavirose são realizados em laboratórios de referência. Os exames estão disponíveis na rede pública de laboratórios para confirmação ou descarte dos casos.

O diagnóstico é feito, basicamente, por meio da sorologia. O Ministério da Saúde disponibiliza os kits necessários para testes sorológicos. 

ELISA-IgM –cerca de 95% dos pacientes com SCPH têm IgM detectável em amostra de soro coletada no início dos sintomas, sendo, portanto, método efetivo para o diagnóstico de hantanvirose.  Imunohistoquímica – técnica que identifica antígenos específicos para hantavírus em fragmentos de órgãos. Particularmente utilizada para o diagnóstico nos casos de óbitos, quando não foi possível a realização do diagnóstico sorológico in vivo.

RT-PCR – método de diagnóstico molecular, útil para identificar o vírus e seu genótipo, sendo considerado exame complementar para fins de pesquisa. Observe-se que quando o óbito é recente possibilita a realização de exame sorológico (ELISA IgM), mediante coleta de sangue do coração ou mesmo da veia.
A coleta de amostra deve ser feita logo após a suspeita do diagnóstico, pois o aparecimento de anticorpos da classe IgM ocorre concomitante ao início dos sintomas e permanecem na circulação até cerca de 60 dias, após o início dos sintomas. Quando em amostra única não for possível definir o diagnóstico, deve-se repetir a coleta e realizar uma segunda sorologia somente nas situações em que o paciente apresentar manifestações clínicas fortemente compatíveis com a SCPH e se a primeira amostra foi coletada nos primeiros dias da doença.

A técnica ELISA-IgG, ainda que disponível na rede pública, é utilizada apenas em estudos epidemiológicos, para detectar infecção viral anterior, em roedores ou em seres humanos.


Tratamento

Não existe um tratamento específico para as infecções por hantavírus. As medidas terapêuticas são fundamentalmente as de suporte, ministradas conforme cada caso por um médico profissional.


Prevenção

A prevenção da hantavirose baseia-se na utilização de medidas que impeçam o contato do homem com os roedores silvestres e suas excretas (resíduos eliminados do organismo).

As medidas de controle devem conter ações que impeçam a aproximação dos roedores, como, por exemplo, roçar o terreno em volta da casa, dar destino adequado aos entulhos existentes, manter alimentos estocados em recipientes fechados e à prova de roedores, além de outras medidas que impeçam a interação entre o homem e roedores silvestres, nos locais onde é conhecida a presença desses animais.


Situação epidemiológica da hantavirose no Brasil

Em algumas regiões do Brasil, observa-se um padrão de sazonalidade, possivelmente decorrente da biologia/comportamento dos roedores reservatórios.
Apesar de a doença ser registrada em todas as regiões brasileiras, o Sul, o Sudeste e o Centro-Oeste concentram maior percentual de casos confirmados. A presença da SCPH até o momento é relatada em 16 Unidades da Federação: Pará, Rondônia, Amazonas, Bahia, São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Paraná, Santa Catarina, Mato Grosso, Maranhão, Rio Grande do Norte, Goiás, Distrito Federal e Mato Grosso do Sul.

As infecções ocorrem principalmente em áreas rurais, em situações ocupacionais relacionadas à agricultura, sendo o sexo masculino com faixa etária de 20 a 39 anos o grupo mais acometido. A taxa de letalidade média é de 46,5% e a maioria dos pacientes necessita de assistência hospitalar.


***

Fontes:

Ministério da Saúde   
•  Manual de Vigilância, Prevenção e Controle das Hantaviroses. (2013)

Avaliação do Sistema de Vigilância de Hantavírus no Brasil  


Fontes das imagens:

Guia dos Roedores do Brasil, com chaves para gêneros baseadas em caracteres externos /C. R. Bonvicino, J. A. Oliveira, P. S. D’Andrea. - Rio de Janeiro: Centro Pan-Americano de Febre Aftosa - OPAS/OMS, 2008.




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