segunda-feira, 29 de março de 2021

Arboviroses Emergentes: DENGUE

 


Dengue é uma doença febril aguda, de etiologia viral, que é transmitida pelo Aedes aegypti, principal mosquito vetor. Conhece-se a existência de quatro sorotipos –  DENV 1, DENV 2, DENV 3  e DENV 4 – e que a doença pode apresentar desde uma evolução benigna na forma clássica até uma evolução grave quando se apresenta na forma hemorrágica ou com complicações.

O vírus Dengue (ou DENV) pertence à família Flaviviridae, uma família de vírus que inclui o vírus da febre amarela, o vírus da encefalite japonesa, o vírus da Febre do Nilo Ocidental (FNO) e o vírus da encefalite do carrapato (TBE). É classificado como um arbovírus, isto é, aquele que é transmitido por insetos ou outros artrópodes.

Hoje a dengue é a mais importante arbovirose que afeta o homem e constitui-se em sério problema de saúde pública no Brasil onde as condições do meio ambiente favorecem o desenvolvimento e a proliferação do vetor. A dengue está relacionada com os chamados macrofatores (ambientais, socioeconômicos, políticos e sociais) e os microfatores (dependentes das características biológicas do vírus, do vetor e da pessoa afetada).

O mosquito transmissor da dengue é originário do Egito, na África, e vem se espalhando pelas regiões tropicais e subtropicais do planeta desde o século 16, período das Grandes Navegações. Admite-se que o vetor foi introduzido no Novo Mundo, no período colonial, por meio de navios que traficavam escravos. Ele foi descrito cientificamente pela primeira vez em 1762, quando foi denominado Culex aegypti. O nome definitivo – Aedes aegypti – foi estabelecido em 1818, após a descrição do gênero Aedes. Relatos da Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS) mostram que a primeira epidemia de dengue no continente americano ocorreu no Peru, no início do século 19, com surtos no Caribe, Estados Unidos, Colômbia e Venezuela.

No Brasil, os primeiros relatos de dengue datam do final do século XIX, em Curitiba (PR), e do início do século XX, em Niterói (RJ).

No início do século XX, o mosquito já era um problema, mas não por conta da dengue -- na época, a principal preocupação era a transmissão da febre amarela. Em 1955, o Brasil erradicou o Aedes aegypti como resultado de medidas para controle da febre amarela. No final da década de 1960, o relaxamento das medidas adotadas levou à reintrodução do vetor em território nacional. Hoje, o mosquito é encontrado em todos os Estados brasileiros.


VETOR

O Aedes aegypti é um mosquito doméstico, que vive dentro ou ao redor de domicílios ou de outros locais frequentados por pessoas, como estabelecimentos comerciais, escolas ou igrejas, por exemplo. Tem hábitos preferencialmente diurnos e alimenta-se de sangue humano, sobretudo ao amanhecer e ao entardecer. Mas ele também pode picar à noite.

Por ser um mosquito que vive perto do homem, sua presença é mais comum em áreas urbanas e a infestação é mais intensa em regiões com alta densidade populacional - principalmente, em espaços urbanos com ocupação desordenada, onde as fêmeas têm mais oportunidades para alimentação e dispõem de mais criadouros para desovar. A infestação do mosquito é sempre mais intensa no verão, em função da elevação da temperatura e da intensificação de chuvas – fatores que propiciam a eclosão de ovos do mosquito.


Ciclo de Vida

Ovo:
•  Mede cerca de 1 mm;
•  Depositados nas paredes internas de recipientes, próximo à superfície da água;
•  Inicialmente brancos e rapidamente ficam pretos e brilhantes;
•  Fecundação se dá no momento da postura;
•  Embriões se desenvolvem em 48 h.
•  Resistência à dessecação por mais de 1 ano;
•  Dispersão passiva. 




Larva:
•  Mede cerca de 1 mm;
•  Depositados nas paredes internas de recipientes, próximo à superfície da água;
•  Inicialmente brancos e rapidamente ficam pretos e brilhantes;
•  Fecundação se dá no momento da postura;
•  Embriões se desenvolvem em 48 h.
•  Resistência à dessecação por mais de 1 ano;
•  Dispersão passiva.




Pupa:
•  Não se alimentam;
•  Ocorre metamorfose da fase larval para o adulto;
•  Mantêm-se flutuando na superfície da água para facilitar a emergência do inseto;
•  O estágio dura de 2 a 3 dias;
•  Dispersão passiva.





Adulto:
•  Fase reprodutiva;
• Mantém-se horas sobre a parede do recipiente para endurecimento do exoesqueleto;
•  Pode acasalar 24 h após emergir;
•  Uma única inseminação fecunda todos os ovos;
•  Vive em média 30 a 40 dias;
•  Colocam em média 280 ovos em sua vida;
•  Fêmeas hematófagas (se alimentam de sangue) e antropofílicas (infectam o ser humano);
•  Dispersão ativa;
•  Repastos das fêmeas nas primeiras horas da manhã e ao anoitecer;
•  Em geral postura após cada repasto sanguíneo;
•  Intervalo entre o repasto e a postura é cerca de 3 dias;
•  Alimenta-se mais de 2 vezes entre duas posturas;
• Ovoposição mais frequente no final da tarde, em recipientes escuros, sombreados e com superfície áspera.
•  Ovoposição preferencialmente em águas  limpas;
•  Distribuição dos ovos em vários recipientes;
•  Pequena capacidade de dispersão pelo vôo  (aproximadamente 300 m);
•  Endofilia e ocasionalmente no peridomicílio;
•  Buscam locais escuros e quietos para repousar.



TRANSMISSÃO

A dengue é transmitida pela picada do mosquito Aedes aegypti. Após picar uma pessoa infectada com um dos quatro sorotipos do vírus, a fêmea pode transmitir o vírus para outras pessoas. Há registro de transmissão por transfusão sanguínea.

Não há transmissão da mulher grávida para o feto, mas a infecção por dengue pode levar a mãe a abortar ou ter um parto prematuro, além da gestante estar mais exposta para desenvolver o quadro grave da doença, que pode levar à morte. Por isso, é importante combater o mosquito da dengue, fazendo limpeza adequada e não deixando água parada em pneus, vasos de plantas, garrafas, pneus ou outros recipientes que possam servir de reprodução do mosquito Aedes aegypti.

Em populações vulneráveis, como crianças e idosos com mais de 65 anos, o vírus da dengue pode interagir com doenças pré-existentes e levar ao quadro grave ou gerar maiores complicações nas condições clínicas de saúde da pessoa.

A dengue não é transmissível de pessoa a pessoa.


SINTOMAS


Os principais sintomas da dengue são:

•  Febre alta > 38.5ºC.
•  Dores musculares intensas.
•  Dor ao movimentar os olhos.
•  Mal estar.
•  Falta de apetite.
•  Dor de cabeça.
•  Manchas vermelhas no corpo.

No entanto, a infecção por dengue pode ser assintomática (sem sintomas), leve ou grave. Neste último caso pode levar até a morte. Normalmente, a primeira manifestação da dengue é a febre alta (39° a 40°C), de início abrupto, que geralmente dura de 2 a 7 dias, acompanhada de dor de cabeça, dores no corpo e articulações, além de prostração, fraqueza, dor atrás dos olhos, erupção e coceira na pele. Perda de peso, náuseas e vômitos são comuns. Em alguns casos também apresenta manchas vermelhas na pele.

Na fase febril inicial da dengue, pode ser difícil diferenciá-la. A forma grave da doença inclui dor abdominal intensa e contínua, vômitos persistentes e sangramento de mucosas. Ao apresentar os sintomas, é importante procurar um serviço de saúde para diagnóstico e tratamento adequados.

São sinais de alarme da dengue os seguintes sintomas:

•  Dor abdominal intensa e contínua, ou dor à palpação do abdome.
•  Vômitos persistentes.
•  Acumulação de líquidos (ascites, derrame pleural, derrame pericárdico).
•  Sangramento de mucosa ou outra hemorragia.
•  Aumento progressivo do hematócrito.
•  Queda abrupta das plaquetas.




DIAGNÓSTICO

O diagnóstico da dengue é clínico e feito por um médico. É confirmado com exames laboratoriais de sorologia, de biologia molecular e de isolamento viral, ou confirmado com teste rápido (usado para triagem).

A sorologia é feita pela técnica MAC ELISA, por PCR, isolamento viral e teste rápido.


TRATAMENTO

Não existe tratamento específico para a dengue. Em caso de suspeita é fundamental procurar um profissional de saúde para o correto diagnóstico.

A assistência em saúde é feita para aliviar os sintomas. Estão entre as formas de tratamento:

•  fazer repouso;
•  ingerir bastante líquido (água);
•  não tomar medicamentos por conta própria;
•  a hidratação pode ser por via oral (ingestação de líquidos pela boca) ou por via intravenosa (com uso de soro, por exemplo);
•  o tratamento é feito de forma sintomática, sempre de acordo com avaliação do profissional de saúde, conforme cada caso.


PREVENÇÃO

Faça vistorias periódicas em sua casa, prestando atenção especial nos locais determinados a seguir:

Área Externa:

•  Garrafas: eliminar a água e mantê-las emborcadas;
•  Calhas e lajes: verificar se acumulam água ou sinais de umidade;
• Vasos de plantas: verificar a presença de pratinhos, pingadeiras, plantas aquáticas. Preencher esses recipientes com areia;
•  Caixa d´água: verificar as condições das tampas. Fazer a reposição daquelas ausentes ou quebradas, ou colocar telas de vedação;
•  Piscinas: devem ser cloradas semanalmente. Se estiverem em desuso, devem ser colocados peixes ou sal no fundo;
•  Piscinas infantis: em desuso devem ser lavadas com bucha e guardadas e em uso a água deve ser trocada semanalmente;
•  Fontes ornamentais: devem ser mantidos peixes como tilápia, guaru, lebiste ou beta;
•  Pneus: devem estar secos e guardados em local coberto;
•  Ralos sem uso contínuo: providenciar tela de mosquiteiro para vedar o ralo;
• Vasilhas para guardar água da chuva: devem ser teladas ou cloradas semanalmente;
•  Outros recipientes: devem estar secos e guardados em local coberto.


Área Interna:

Sala de Visitas

•  Vasos de plantas: verificar a presença de plantas aquáticas. Troque a água e lave o vaso com escova uma vez por semana.


Cozinha

•  Bandeja de geladeira: eliminar a água acumulada e colocar detergente; 
•  Vazamentos: que possam estar acumulando água em gabinetes ou armários;
•  Filtro de água: verificar se a limpeza está sendo feita rotineiramente e se não há presença de larvas.


Banheiros

• Vasos sanitários: em desuso, mantê-los vedados com sacos plásticos e fita adesiva;
•  Ralos: em desuso, colocar tela mosquiteiro ou um tapete em cima;
•  Caixa acoplada a vasos: verificar se está bem vedada.


Área de Serviço

•  Tanque: verificar vazamentos que possam estar acumulando água em algum ponto;
•  Tanque: em desuso, vedar ralos e mantê-los em local coberto;
•  Ralos sem uso contínuo: providenciar tela para vedar o ralo;
• Outros: verificar a presença de baldes, latas, potes, copos e etc., secá-los e guardá-los em local coberto ou emborcá-los.

***


Fontes:


quinta-feira, 11 de março de 2021

Arboviroses Emergentes: ZIKA

 

O que é Zika?

A zika é uma arbovirose (doença causadas por arbovírus, isto é, vírus que tem parte de seu ciclo de replicação nos artrópodes) também conhecida como infecção por zika vírus. Esse vírus é transmitido para seres humanos por meio da picada do mosquito Aedes aegypti e do Aedes albopictus. Ele é chamado assim porque os primeiros sinais da doença foram encontrados na Floresta Zika, localizada em Uganda (1947).



Em 2015 houve a identificação do vírus ZIKV no Brasil (suspeita-se que a introdução tenha ocorrido em 2013), que passou por uma epidemia de casos de zika, com milhares de pessoas diagnosticadas com a doença. Muitas mulheres grávidas sofreram e tiveram bebês que foram diagnosticados com microcefalia, uma condição médica em que o crânio do bebê é menor do que o normal para a sua idade, causando diversos atrasos em seu desenvolvimento mental e intelectual, por exemplo. 

Antes de se expandir para uma epidemia humana plenamente estabelecida, atingindo as manchetes de jornais como uma ameaça global, o zika vírus esteve presente por muito tempo na África e, em algum momento, chegou à Ásia. Na África, o zika vírus pode ter circulado principalmente entre os animais e só ocasionalmente pulou para os humanos. Tal vírus era caracterizado como um patógeno leve e essencialmente inofensivo; essa é a principal diferença entre ele e outros vírus emergentes percebidos como ameaças globais. O zika era considerado menos perigoso que os demais pertencentes ao mesmo grupo, os flavivírus; não se suspeitava de que ele seria capaz de prejudicar seriamente os fetos.  

A doença pelo vírus Zika apresenta risco superior a outras arboviroses, como dengue, febre amarela e chikungunya, para o desenvolvimento de complicações neurológicas, como encefalites, Síndrome de Guillain Barré e outras doenças neurológicas. Uma das principais complicações é a microcefalia. 


Transmissão

Existem três formas principais de transmissão do Zika Vírus:

•  Transmissão pela picada do mosquito Aedes Aegypti.

•  Transmissão sexual.

•  Transmissão de mãe para o feto durante a gravidez 



No caso do feto ser infectado durante a gestação, este pode desenvolver lesões cerebrais irreversíveis e ter comprometida, definitivamente, toda a sua estrutura em formação. As doenças neurológicas, especialmente nas crianças com a doença congênita (infectados no útero materno), têm sequelas de intensidade variável, conforme cada caso.

O comprometimento nesses casos é tão importante que algumas crianças, ao nascerem, têm microcefalia, uma deformação dos ossos do cabeça, sinal do não crescimento adequado do encéfalo (cérebro). 

Não há evidências de transmissão do vírus Zika por meio do leite materno, assim como por urina e saliva.


Sintomas

Cerca de 80% das pessoas infectadas pelo vírus zika não desenvolvem manifestações clínicas. Entre os principais sintomas, podemos destacar:

•  dor de cabeça; 

•  febre baixa; 

•  dores leves nas articulações; 

•  manchas vermelhas na pele; 

•  coceira; 

•  vermelhidão nos olhos;

•  inchaço no corpo;

•  dor de garganta;

•  tosse; 

•  vômitos.

No geral, a evolução da doença é benigna e os sintomas desaparecem espontaneamente após 3 a 7 dias. No entanto, a dor nas articulações pode persistir por aproximadamente um mês. Formas graves e atípicas são raras, mas quando ocorrem podem, excepcionalmente, evoluir para óbito, como identificado no mês de novembro de 2015, pela primeira vez na história.

 


Diagnóstico

O diagnóstico do Zika Vírus é clínico e feito por um médico. O resultado é confirmado por meio de exames laboratoriais de sorologia e de biologia molecular ou com o teste rápido, usado para triagem. A sorologia é feita pela técnica MAC ELISA, por PCR e teste rápido. Todos os exames estão disponíveis no Sistema Único de Saúde (SUS).

Os recém-nascidos com suspeita de comprometimento neurológico necessitam de exames de imagem, como ultrassom, tomografias ou ressonância magnética.


Tratamento

No geral, a infecção por zika vírus tem uma evolução benigna e, em poucos dias, a pessoa se encontra livre dessa condição médica. Não existe uma cura direta para o vírus, mas os sintomas da doença podem ser tratados com o uso de medicamentos, sendo que alguns remédios de uso comum devem ser evitados ao máximo, já que aumentam as chances de hemorragia do paciente. 

Idosos e grávidas devem ter um acompanhamento médico constante, por conta das complicações dessa condição médica.

A febre por zika vírus costuma durar sete dias.


Prevenção

As medidas de prevenção e controle são semelhantes aos da dengue e chikungunya. A melhor forma de prevenção, e a mais eficaz de todas elas, é evitar a proliferação do mosquito Aedes aegypti, eliminando água armazenada que podem se tornar possíveis criadouros, como em vasos de plantas, latões de água, pneus, garrafas plásticas, piscinas sem uso e manutenção, e até mesmo em recipientes pequenos, como tampas de garrafas e pratos de plantas.

Atualmente não há vacina disponível contra o Vírus Zika. Por isso, é essencial que a população faça a sua parte. Se cada um agir corretamente e tomar todos os cuidados possíveis diários para evitar criadouros do mosquito Aedes aegypti, é possível evitar o Zika Vírus, a microcefalia, a febre amarela, a dengue e a chikungunya.  

Cuidados - gestantes

•  Busque uma Unidade Básica de Saúde para iniciar o pré-natal assim que descobrir a gravidez e compareça às consultas regularmente.

•  Vá às consultas às consultas uma vez por mês até a 28ª semana de gravidez; a cada quinze dias entre a 28ª e a 36ª semana; e semanalmente do início da 36ª semana até o nascimento do bebê.

•  Tome todas as vacinas indicadas para gestantes.

•  Em caso de febre ou dor, procure um serviço de saúde. Não tome qualquer medicamento por conta própria.


Fontes: Ministério da Saúde

Fiocruz

Rede D’Or São Luiz

Zika no Brasil: história recente de uma epidemia /  Ilana Löwy – Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2019.

Imagens:  freepik.com


terça-feira, 9 de março de 2021

Covid-19: pesquisador fala sobre reinfecção e o surgimento de mutações no vírus Sars-CoV-2

 

Nessa entrevista, o pesquisador da Fiocruz Amazônia Felipe Naveca explica a importância da vigilância genômica desenvolvida pelo SUS no momento em que o país bate novo recorde de óbitos em decorrência da Covid-19. O pesquisador também fala sobre as características da nova cepa do vírus Sars-CoV-2 surgida em Manaus, a variante designada como P.1, associada a casos de reinfecção por Covid-19 no estado, e defende a necessidade de medidas de isolamento social mais restritivas para conter o avanço do vírus e evitar o surgimento de novas mutações, com potencial para tornar o controle da pandemia ainda mais difícil.



EPSJV/Fiocruz: Fale do papel da Fiocruz Amazônia no sequenciamento dessa nova cepa que foi identificada em Manaus. O que se sabe sobre ela, qual a sua origem, seu grau de transmissibilidade, e qual é o risco que existe em relação à perda da eficácia das vacinas contra a Covid-19?

Felipe Naveca: Nós estamos sequenciando coronavírus desde o primeiro caso, em março do ano passado. Nós submetemos um artigo na semana passada que conta a história toda da vigilância genômica do coronavírus do Amazonas, desde o primeiro caso. Dentro disso, nós não tínhamos nenhuma informação nem perto da variante P1 até novembro, nada que fosse nem similar. Quando, no dia 10 de janeiro, os pesquisadores do Japão deram o alerta de que tinham encontrado algo muito diferente em pessoas que tinham passado pelo Amazonas, isso chamou atenção e nós fomos comparar os dados que eles tinham obtido. E realmente nada apontava para isso até novembro. Nós conseguimos confirmar o que o dado epidemiológico dizia. As pessoas tinham passado pelo Amazonas e nossos dados genéticos confirmaram que a origem da P1 era a linhagem 28 que circulava no Amazonas. No outro dia nós tínhamos um experimento em andamento para sequenciamento de um caso suspeito de reinfecção, e aí já apareceu a variante P1 exatamente igual à sequência obtida no Japão, e já causando reinfecção. A coisa foi muito rápida naquele período, de um dia para o outro as informações já mudavam, e hoje nós temos três casos de reinfecção confirmados por P.1 no Amazonas. Três mulheres que tiveram doença leve na segunda vez, felizmente, mas foram casos de reinfecção. E duas delas chamaram muita atenção. Uma pelo fato de que a paciente tinha feito teste de anticorpos uma semana antes, mais ou menos, e tinha dado positivo, ou seja, ela tinha anticorpos, e mesmo assim foi infectada; e outro caso foram apenas 92 dias [após a primeira infecção]. Ou seja, provavelmente teria anticorpos, era muito cedo para ter perdido. Isso sugere que a P1 possa estar escapando dos anticorpos. A gente ainda não tem certeza disso, tem experimentos em andamento no IOC e também em Oxford, junto com o pessoal da AstraZeneca, para entender isso melhor.

Nossos dados genéticos apontaram para um possível surgimento entre o dia 15 de novembro e o dia 4 de dezembro, e justamente a amostra mais antiga que nós conseguimos identificar é do dia 4 de dezembro. Então, isso também bate com as estimativas, não conseguimos identificar antes disso. Nós desenvolvemos um teste de PCR em tempo real para ajudar no screening dessa amostra, para não ter que tudo ir para o sequenciamento, que é mais caro, mais demorado, mais laborioso. A gente consegue fazer uma triagem com uma ferramenta de PCR em tempo real que nós desenvolvemos para as variantes mais importantes. Então, ela detecta a P1, a variante do Reino Unido e a variante sul-africana, porque elas têm uma mutação em comum. E aí nós começamos a usar esse teste pra screening, e hoje nós temos mais ou menos 800 amostras testadas do Amazonas, e com isso percebemos que foi aumentando ao longo do tempo o percentual de pessoas infectadas com a P1. Na primeira semana, foi 5%, depois passa a 17%, 40%, 60% e hoje a gente está perto de 80% das amostras detectadas para P1. Hoje ela praticamente domina a circulação do Sars-CoV-2 no Amazonas.


EPSJV/Fiocruz: O que é a vigilância genômica e qual o seu papel numa pandemia como essa?

Felipe Naveca: A vigilância genômica seria a incorporação das informações genéticas ou de genomas inteiros dentro do que é a vigilância em saúde de uma maneira geral. Hoje nós fazemos a vigilância de eventos ou de agravos, não só baseados em dados como data de coleta ou por onde o paciente passou, mas incluímos também dados genéticos que corroboram isso. Usamos a informação presente dentro do genoma dos patógenos, como uma assinatura, para aquilo que a gente quer afirmar. Por exemplo, a maioria das variações de um genoma de patógeno, as mutações que a gente sempre fala, não tem uma consequência de tornar um vírus mais ou menos infeccioso, mais ou menos grave. Elas são fenômenos que acontecem e vão se acumulando no material genético desses vírus. Mas a vigilância genômica, por exemplo, utiliza essa informação para rastrear se esse vírus passou por São Paulo, por Brasília, por onde ele passou até chegar ao Amazonas.

Um outro ponto é que quando nós fazemos a análise de um genoma de um patógeno, principalmente de um patógeno como o Sars-CoV-2, que era algo realmente novo para a humanidade, nós, comunidade científica, conseguimos ver se um teste de PCR, que é o mais utilizado hoje, por exemplo, precisa ser adaptado, corrigido, porque uma mutação atrapalhou no diagnóstico.

A vigilância genômica também nos permite isso. E também vai nos permitir identificar eventos como o surgimento de uma variante com mutações importantes, mutações que realmente alteraram a estrutura do vírus de maneira a torná-lo mais transmissível, que foi o que aconteceu em Manaus.


EPSJV/Fiocruz: Qual é a estrutura disponível hoje no Brasil para desenvolver a vigilância genômica?

Felipe Naveca: A vigilância genômica hoje é executada por alguns laboratórios de referência. A Fiocruz é laboratório de referência nacional para vírus respiratório e sarampo, no IOC [Instituto Oswaldo Cruz, no Rio de Janeiro], mas também em outras unidades, no Amazonas, e em Pernambuco, por exemplo. E junta-se a isso uma rede oficial: o Instituto Evandro Chagas, no Pará e o Instituto Adolfo Lutz em São Paulo. Essas são as estruturas diretamente ligadas à rede de vigilância de vírus respiratórios que já existiam, e que passaram a fazer também do Sars-CoV-2. Há ainda alguns Lacen [Laboratórios Centrais de Saúde Pública]  que se estruturaram para fazer essa vigilância genômica, como, por exemplo, na Bahia e em Minas Gerais, e também algumas universidades. Há uma rede do Ministério de Ciência e Tecnologia fazendo isso. Tudo isso se soma para que a gente tenha uma rede de vigilância.

Claro que no Brasil ela ainda é bastante incipiente, se nós formos comparar com Inglaterra e Estados Unidos, que já fazem isso há anos e têm investimento maciço. Mas o Brasil hoje responde por mais da metade das sequências da América Latina, então a gente também tem que contextualizar dentro de um enfoque regional. Mas a ideia é que nós cada vez mais consigamos ampliar essa rede de vigilância para poder trazer essa informação mais rápido.


EPSJV/Fiocruz: Quais as principais dificuldades que você vê para o desenvolvimento da vigilância genômica no SUS hoje?

Felipe Naveca: O primeiro ponto é que praticamente todos os insumos utilizados para vigilância genômica são importados. Os grandes fabricantes estão nos Estados Unidos ou na Europa, então a gente tem uma dependência  desse tipo de insumo, que não vai resolver agora, mas é algo que a gente precisa começar a pensar, pelo menos a médio e longo prazo. A gente deveria ter pelo menos a possibilidade de ter fabricação no Brasil de alguns insumos estratégicos, mas não tem.


EPSJV/Fiocruz: Por exemplo?

Felipe Naveca: Os insumos do sequenciamento propriamente dito são algumas enzimas. Tudo bem que muita coisa é patenteada,mas tudo isso é produzido fora do país. Se eu for comparar, por exemplo, com um instituto de pesquisa semelhante nos Estados Unidos, se ele não tiver esse produto hoje, vai ter no dia seguinte; eu vou ter daqui a um mês. Esse é o primeiro ponto. Não estou nem falando de dinheiro, estou falando de logística mesmo. E eu teria em 20 dias se estivesse no Rio ou em São Paulo e teria em 30 dias estando no Amazonas. Ainda tem uma logística interna que também é complicada.

O segundo ponto nós sentimos na pele, por exemplo, quando eu ganhei um projeto para fazer esse trabalho. O câmbio do dólar acho que era menos de R$ 4 e hoje é R$ 5 e tanto. Se nós temos os insumos todos importados, eu perdi uns 30%, 40% do meu poder de compra por causa do câmbio, porque eu recebi em real, mas compro algo que é vinculado à taxa de câmbio do dólar. Pensando ainda que hoje existe uma demanda mundial para isso, e quando você coloca o peso de Reino Unido e Estados Unidos, eles vão comprar numa escala muito maior. Em alguns momentos a gente teve dificuldade até de receber insumos porque a demanda mundial estava tão grande, principalmente no início da pandemia, que não chegava, simplesmente não tinha. É outro ponto importante que a gente precisa pensar, vinculado a essa dependência. Não só de incentivar algumas coisas de desenvolvimento no Brasil, mas de tirar essa dependência, porque isso é uma questão de soberania num momento como esse.  Isso pesa bastante quando a gente pensa em comparar com outros países. A Inglaterra faz 200 vezes mais sequenciamento que o Brasil , mas o investimento é 200 vezes maior também.


EPSJV/Fiocruz: Como as restrições orçamentárias no SUS ao longo dos últimos anos têm afetado a vigilância genômica especificamente?

Felipe Naveca: É difícil dizer, porque a vigilância genômica, do tamanho que está hoje, só começou com o Sars-CoV-2 no Brasil. A gente já faz isso há anos para dengue, Zika, mas nada perto do que a gente está fazendo hoje. Há alguns anos a gente falava de sequenciar um pedaço do vírus, e aquilo já era ótimo, a gente conseguia ter informações com aquilo. Hoje a gente está falando, por exemplo, de sequenciar genomas inteiros do coronavírus, que é três vezes maior do que o da dengue. Hoje, praticamente ninguém fala em fazer sequenciamento parcial, até porque, como a gente está precisando entender melhor esse vírus, as mutações vão aparecendo ao longo do genoma inteiro, não só numa região. O mundo inteiro tem investido em fazer genomas inteiros do vírus para que a gente consiga entender isso melhor.

O que eu quero dizer é que, hoje, além de a gente estar fazendo genomas inteiros, estamos fazendo de algo que é três vezes maior. Mas isso se deve a um avanço científico nessa área. É algo que veio para ficar e a gente tem que estar mais estruturado para outras situações como essa. A gente tem que lembrar que em 2002 apareceu o primeiro Sars-CoV-2, por isso esse é o 2. Ele teve um impacto forte na Ásia, chegou a ter casos no Canadá, nos Estados Unidos, mas claro que nada nem perto dessa situação de hoje. Mas foi o primeiro evento que mostrou que um coronavírus tinha um potencial de causar uma pandemia. Depois a gente teve o Mers-CoV, de 2012 para 2013, que foi bastante limitado, mas com uma letalidade altíssima. Ou seja, em menos de 20 anos nós tivemos três eventos importantes de emergência de um coronavírus e, provavelmente, esse não vai ser o último. Então, temos que estar mais bem preparados para identificar rapidamente, isolar os casos o mais rápido possível para que ele não transmita. Temos que pensar que do ponto d,e vista de saúde pública, o objetivo não é impedir que isso aconteça, que é praticamente impossível, mas identificar da maneira mais precoce e conseguir conter.


EPSJV/Fiocruz: Nessa semana ganhou destaque a movimentação de alguns governos estaduais para pressionar pela adoção de medidas de isolamento social mais rígidas face à escalada do número de mortes por Covid-19 no país, que voltou a bater recorde, e a iminência do colapso no sistema de saúde em vários estados. Até que ponto medidas mais restritivas de isolamento social poderiam ter freado esse processo de mutação que levou ao surgimento da nova cepa em Manaus?

Felipe Naveca: Não fizemos em nenhum momento um lockdown mesmo, para valer, em nenhuma região do país. Então é isso: quanto mais casos você tem, mais mutações, e maior a possibilidade de surgir uma variante do vírus. E foi o que aconteceu na Inglaterra, onde o surgimento dessa variante se deu logo após as férias de verão, quando houve uma queda no distanciamento. Agora a gente está vendo o surgimento de duas variantes ainda não classificadas no mesmo nível das outras três, mas já classificadas como alerta, que são uma variante de Nova Iorque e outra da Califórnia, nos Estados Unidos. Isso mostra mais um exemplo de que onde você tem muita transmissão do vírus podem surgir variantes assim.

A gente não pode atrasar demais a adoção dessas medidas, lembrando que a nossa vacinação ainda está muito no início, e quanto mais tempo demorar, mais pessoas infectadas teremos, e vai ser cada vez mais difícil contornar a situação.


EPSJV/Fiocruz: E quanto à eficácia das vacinas frente às novas cepas?

Felipe Naveca: Tem resultados ainda muito preliminares. Saiu uma pré-publicação  agora sobre isso, mas com um número muito pequeno de amostras avaliadas, não dá para ter muita confiança quando você faz um tipo de análise com um número de amostras muito pequeno. A gente acredita que o somatório dos resultados que vierem daqui para frente vai nos dar essa certeza. Mas se nós pensarmos que a nossa variante P1 tem pelo menos três mutações muito importantes iguais às da África do Sul, e na África do Sul houve uma queda de eficiência das vacinas, não imagino que nós vamos ver um cenário diferente. A questão é quanto vai cair a eficácia das vacinas.


08/03/2021

Por: André Antunes (EPSJV/Fiocruz)


Fonte:  Fiocruz

terça-feira, 2 de março de 2021

Monitoramento ambiental em Niterói contribui para a prevenção ao novo coronavírus


O projeto de vigilância do novo coronavírus em esgotos de Niterói, na Região Metropolitana do Rio de Janeiro, teve resultados publicados no periódico Water Research, uma prestigiada revista científica internacional. Os achados destacam o uso da metodologia como um sistema de alerta precoce para o surgimento de novos casos de Covid-19, permitindo ações de saúde pública e medidas de prevenção mais rápidas. A publicação contempla o período de abril a agosto de 2020, quando foram coletadas 223 amostras. O projeto soma mais de 400 coletas. A iniciativa é da Fiocruz, em parceria com a prefeitura do município e a concessionária Águas de Niterói.

 

Com apoio da empresa Águas de Niterói, coletas contemplam estações
de tratamento de esgoto e pontos da rede coletora (Foto: Josué Damacena)


O monitoramento tem como base a eliminação do coronavírus nas fezes das pessoas infectadas, o que faz com que o patógeno possa ser encontrado no esgoto. Além de verificar a presença ou ausência do vírus em tubulações e estações de tratamento de esgoto (ETEs), os pesquisadores analisam a quantidade de material genético viral presente nas amostras. Os dados são utilizados para produzir mapas de calor, caracterizando a transmissão nas diferentes regiões da cidade. O município disponibiliza as informações para a população através do portal Acompanhamento dos Casos de Coronavírus (Covid-19) Niterói.

“A partir do momento em que foi identificada a presença do coronavírus nas fezes, estudos sobre epidemiologia baseada no esgoto foram iniciados em diversos países. Em Niterói, conseguimos implantar o projeto no começo da pandemia e observamos que a metodologia é capaz de apontar a dispersão do vírus no ambiente, contribuindo para subsidiar as estratégias de enfrentamento das autoridades de saúde. A cooperação entre os laboratórios da Fiocruz, a Prefeitura de Niterói e a concessionária Águas de Niterói foi fundamental para esse resultado”, afirma Marize.

Um dos exemplos da eficácia da metodologia foi a identificação de transmissão oculta da Covid-19 na comunidade Boa Esperança, em Piratininga, Região Oceânica da cidade. Na segunda semana do monitoramento, o vírus foi detectado em tubulações de esgoto da localidade, onde ainda não havia registro oficial de casos. A partir do resultado, equipes do Programa de Saúde da Família foram às ruas para encontrar possíveis infectados, por meio da identificação de pessoas com sintomas e realização de testes diagnósticos. Ações para conter a disseminação da doença foram implantadas, e a população recebeu orientações sobre o agravo.

"Nessa pandemia, nos deparamos com o inusitado e não havia parâmetros para a gestão. O monitoramento do esgoto expandiu a base de evidências científicas. No início, em abril de 2020, funcionou como um alerta sobre a chegada do vírus aos territórios da cidade. Hoje, é mais um parâmetro que quantifica a carga viral do vírus presente nos esgotos sanitários de cada um dos pontos de coleta, permitindo assim, uma comparação regionalizada com o número de notificações dos casos. Os dados são sistematicamente lançados em um painel virtual, de acesso público. A transparência dos dados contribui para que a população possa acompanhar a evolução da história natural dessa nova doença”, comenta a diretora de Atenção à Saúde da Fundação Estatal de Saúde de Niterói (Fesaúde/Niterói), Stefania Soares.

Liderado pelo Laboratório de Virologia Comparada e Ambiental do IOC/Fiocruz, o projeto tem a colaboração do Laboratório de Vírus Respiratórios e do Sarampo, também do Instituto, e do Departamento de Saneamento e Saúde Ambiental da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca (Ensp/Fiocruz). Na Prefeitura de Niterói, a pesquisa conta com a cooperação das Secretarias Municipais de Saúde; de Planejamento, Orçamento e Modernização da Gestão; e de Meio Ambiente, Recursos Hídricos e Sustentabilidade; além do Sistema de Gestão da Informação (SIGeo Niterói).

 

Metodologia aplicada na pesquisa identifica fragmentos do material
genético do SARS-CoV-2 em amostras de esgoto (Foto: Josué Damacena)


Evolução da pandemia

De abril a setembro, o monitoramento contou com coletas semanais de amostras em duas estações de tratamento de esgoto e dez pontos na rede coletora. Considerando a demanda da Prefeitura por informações, foram analisados pontos nos bairros de Icaraí, Vital Brazil, Santa Rosa, Camboinhas, Itaipu, Barreto, Engenhoca, Sapê, Ititioca, Várzea das Moças e Rio do Ouro, assim como nas comunidades do Morro do Palácio, Preventório, Cascarejo, Morro do Estado, Boa Esperança, Caramujo, Vila Ipiranga e Maceió.

“Os locais de coleta foram estabelecidos em conjunto com a Secretaria Municipal de Saúde, que apontou as áreas de interesse para o monitoramento, incluindo regiões populosas da cidade e comunidades com maior vulnerabilidade. O apoio da empresa de saneamento nos permitiu rapidamente identificar os melhores pontos para a amostragem e assim produzir dados para subsidiar ações em localidades específicas. Esse foi um diferencial do projeto”, destaca a engenheira sanitarista da ENSP/Fiocruz e autora do estudo, Camille Mannarino.

De acordo com os pesquisadores, a vigilância do esgoto vem refletindo a evolução da pandemia em Niterói. Em abril, 42% das amostras foram positivas para o Sars-CoV-2. Já de maio a junho, quando ocorreu o primeiro pico da doença na cidade, a taxa de positividade ficou acima de 90%, alcançando 100% em algumas semanas. O índice caiu a partir de julho, chegando a 50% no começo do agosto. Após o relaxamento de medidas de distanciamento social, os números voltaram a subir. Na última semana de agosto, o vírus foi encontrado em 75% das amostras. Em novembro, durante o segundo pico de casos, a pesquisa voltou a detectar o Sars-CoV-2 entre 90% e 100% das amostras.

Desde dezembro, os registros de casos e mortes e a taxa de ocupação de leitos hospitalares por Covid-19 vêm caindo em Niterói. Porém, a detecção do coronavírus no esgoto permanece em patamares elevados. Na última semana do ano passado, 100% das amostras foram positivas para o SARS-CoV-2, e a carga viral média, considerando os 12 pontos de coleta, foi a segunda maior registrada desde o início do levantamento. Em janeiro, a concentração de vírus detectada no esgoto caiu um pouco, mas o patógeno ainda foi encontrado em 80% a 90% dos pontos pesquisados.

A coordenadora da pesquisa afirma que alta carga viral no esgoto em contraponto com os poucos casos registrados pode indicar a necessidade de ampliação de testes, maior número de assintomáticos ou pessoas com doença leve, que não procuram o serviço de saúde. “A presença do vírus nas amostras aponta que ele está circulando na população. Mas a vigilância do esgoto deve ser sempre considerada como um indicador complementar, junto com outros dados relacionados à doença”, ressalta Marize.

Segundo a virologista, a mudança nos pontos de coleta de amostras também pode influenciar nos resultados do levantamento. Desde outubro, o monitoramento passou a ser realizado a cada duas semanas, em oito estações de tratamento e quatro tubulações. Por receber o esgoto de diversos bairros, as ETEs são estratégicas para apontar tendências de transmissão da Covid-19, mas também apresentam taxa de positividade para o Sars-CoV-2 maior do que as tubulações.


Sequenciamento genético

O artigo publicado traz ainda os resultados do sequenciamento genético dos vírus encontrados no esgoto de Niterói. Em quatro amostras, os pesquisadores conseguiram decodificar o genoma completo do patógeno. A análise confirma a presença da linhagem predominante no estado do Rio de Janeiro no período de abril a agosto, chamada de B.1.1.33 (clado G). De acordo com Marize, o dado reforça a validade dos achados da pesquisa. “O sequenciamento genético de amostras ambientais é difícil porque o vírus sofre degradação. Esse resultado evidencia que o ambiente reflete o que está circulando na população”, pontua a virologista.

O convênio firmado entre a Fiocruz e a Prefeitura de Niterói para realização do projeto tem duração prevista até março de 2021, com possibilidade de renovação. “Nesse momento, continuamos com o monitoramento e pretendemos realizar novos sequenciamentos genéticos, por exemplo, para monitorar a circulação de variantes virais e o reflexo da vacinação”, comenta Marize.


Fonte:  Fiocruz


Caracol Gigante Africano: vamos conhecer?