segunda-feira, 16 de junho de 2025

FEBRE DO OROPOUCHE: DOENÇA, VETORES E SITUAÇÃO EPIDEMIOLÓGICA NO BRASIL

 



Febre do Oropouche é uma doença causada por um arbovírus (vírus transmitido por artrópodes) do gênero Orthobunyavirus, da família Peribunyaviridae. O Orthobunyavirus oropoucheense (OROV) foi isolado pela primeira vez no Brasil em 1960, a partir de amostra de sangue de uma bicho-preguiça (Bradypus tridactylus) capturada durante a construção da rodovia Belém-Brasília. Desde então, casos isolados e surtos foram relatados no Brasil, principalmente nos estados da região Amazônica. Também já foram relatados casos e surtos em outros países das Américas Central e do Sul.

 

Transmissão

A transmissão do Oropouche é feita principalmente pelo inseto conhecido como Culicoides paraensis (maruim). Depois de picar uma pessoa ou animal infectado, o vírus permanece no inseto por alguns dias. Quando o inseto pica uma pessoa saudável, pode transmitir o vírus.

Existem dois tipos de ciclos de transmissão da doença:

  • Ciclo Silvestre:  No ciclo silvestre, bichos-preguiça e primatas não-humanos (e possivelmente aves silvestres e roedores) atuam como hospedeiros. Há registros de isolamento do OROV em algumas espécies de insetos, como Coquillettidia venezuelensis e Aedes serratus. No entanto, o vetor primário é o Culicoides paraensis, conhecido como maruim ou mosquito-pólvora.



  • Ciclo Urbano:  Nesse ciclo, os humanos são os principais hospedeiros do vírus. O inseto Culicoides paraenses também é o vetor principal. O inseto Culex quinquefasciatus, comumente encontrado em ambientes urbanos, pode ocasionalmente transmitir o vírus também.

 


Características do vetor

Culicoides paraensis é, possivelmente, um inseto nativo das Américas. Ele foi descrito, pela primeira vez, no Pará, em 1905, por Emilio Goeldi. A nomeação da espécie faz referência ao estado. Atualmente, ele é encontrado na maior parte do continente americano, desde o sul dos Estados Unidos até a Argentina. No Brasil, acredita-se que esteja presente em todos os estados, apesar de só ter sido efetivamente registrado em 15 estados até o momento.  Outra característica é a picada muito dolorosa. É um inseto que causa incômodo para a população quando há infestação. 

A fêmea do maruim procura locais com bastante matéria orgânica e umidade para depositar seus ovos. Nas florestas, troncos de árvore em decomposição, cascas de frutas caídas no chão, bromélias, beiras de riachos, folhagem do solo são os locais preferenciais. Nos bananais, ela deposita os ovos no cepo da bananeira, parte do caule que fica quando a árvore é cortada para colheita da banana. Na área urbana, ela pode colocar ovos no quintal se houver qualquer tipo de matéria orgânica acumulada no chão. 

Os maruins adultos, machos e fêmeas, se alimentam do néctar de plantas. Porém, somente as fêmeas picam seres humanos e animais, pois precisam de sangue para amadurecimento dos ovos. Estudos sobre insetos do gênero Culicoides apontam que as fêmeas podem colocar de 30 a 450 ovos por postura, dependendo da espécie e da refeição sanguínea. Mas não há informação específica sobre C. paraensis

O ciclo de vida é parecido com o dos mosquitos. Nos criadouros, os ovos eclodem liberando as larvas que se alimentam da matéria orgânica. As larvas passam por quatro estádios de desenvolvimento, depois se tornam pupas, que não se alimentam e se transformam no inseto adulto. Porém, não há dados específicos sobre o tempo de desenvolvimento do C. paraensis

Ele tende a ficar próximo do seu local de reprodução. O voo próprio dele fica em torno de 500 m. Mas, como o maruim é muito leve, ele é dispersado pelo vento. Então, dependendo da velocidade do vento, ele pode alcançar até 2 km voando.

O pico de atividade, em que os maruins se alimentam com maior intensidade, é no final da tarde. Mas eles podem picar em outros horários, durante todo o dia, dependendo da presença do ser humano ou de outro animal no ambiente. 

A título de comparação, o Culicoides paraenses mede até 3 milímetros, sendo cerca de 12 vezes menor do que o mosquito transmissor da dengue e 20 vezes menor do que o Culex quinquefasciatus, que é o pernilongo mais comum no país.

 

Sintomas

O período de incubação (o tempo entre a picada de um inseto infectado e os primeiros sintomas) do vírus Oropouche é normalmente de 3 a 10 dias. Os sintomas da doença incluem febre, dor de cabeça, dor nas articulações (artralgia), dor muscular (mialgia), calafrios, náuseas, vômitos e erupções cutâneas. Os sintomas são parecidos com os da dengue, então, nesse sentido, é importante que profissionais da área de vigilância em saúde sejam capazes de diferenciar essas doenças por meio de aspectos clínicos, epidemiológicos e laboratoriais e orientar as ações de prevenção e controle. 

A compreensão das complicações da doença causada pelo vírus Oropouche é limitada. Ocasionalmente, pode ocorrer meningite asséptica.

Em 2024, houve relatos no Brasil descrevendo cinco casos de possível transmissão do vírus Oropouche durante a gravidez (quatro natimortos e um aborto espontâneo), bem como quatro casos de recém-nascidos com microcefalia detectados por meio de investigações retrospectivas. Apesar da detecção do RNA viral, não se pode concluir que a infecção por OROV tenha sido a causa das mortes fetais, e as investigações ainda estão em andamento.

Segundo dados do Ministério da Saúde, a doença atinge mais a faixa etária dos 20 aos 49 anos, prevalecendo o sexo masculino.

 

Diagnóstico

O diagnóstico é clínico, epidemiológico e laboratorial. Todo caso com diagnóstico de infecção pelo OROV deve ser notificado. O Oropouche compõe a lista de doenças de notificação compulsória, classificada entre as doenças de notificação imediata, em função do potencial epidêmico e da alta capacidade de mutação, podendo se tornar uma ameaça à saúde pública.

 

Tratamento

Não existe tratamento específico. Os pacientes devem permanecer em repouso, com tratamento sintomático e acompanhamento médico.

 

Prevenção

Recomenda-se:

  • Evitar o contato com áreas de ocorrência e/ou minimizar a exposição às picadas dos vetores.
  • Usar roupas que cubram a maior parte do corpo, como blusa de manga longa, calça comprida e sapato fechado.
  • Limpeza de terrenos e de locais de criação de animais.
  • Recolhimento de folhas e frutos que caem no solo.
  • Uso de telas de malha fina, tipo voil, em portas e janelas.
  • Se houver infestação perto de casa, fechar as janelas no horário de pico do vetor (fim da tarde). 

Segundo a pesquisadora e curadora da Coleção de Ceratopogonidae do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) Maria Clara Alves Santarém, não adianta usar repelente, inseticida ou tela para se proteger do maruim: “Tanto pela literatura científica como por experiência própria, sabemos que os repelentes não são eficazes contra maruim. Inseticidas também não funcionam. São compostos desenvolvidos contra mosquitos, como Aedes e Culex, que são insetos de uma família diferente. Como os maruins atravessam a tela comum, é recomendado utilizar telas de malhas finas, tipo voil, o que seria tão eficaz quanto fechar as janelas”.

 

A Febre do Oropouche no mundo

Antes do final de 2023, a doença causada pelo vírus Oropouche foi relatada no Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador, Haiti, Panamá, Peru, Trinidad e Tobago, Guiana Francesa e Venezuela; a maioria dos casos foi relatada perto da floresta amazônica. No entanto, desde dezembro de 2023, houve um aumento no número de casos relatados, inclusive em áreas onde a transmissão não havia sido documentada anteriormente.

Em 2024, a doença do vírus Oropouche, transmitida localmente, foi relatada em sete países da América Latina e do Caribe: Brasil, Bolívia, Colômbia, Cuba, Guiana, Peru e República Dominicana. Além disso, casos da doença do vírus Oropouche foram relatados entre viajantes que retornaram de países com transmissão local para os Estados Unidos, Canadá, Espanha, Itália e Alemanha.

Em 2025, entre as semanas epidemiológicas (SE) 1 e 4, foram registrados 3.765 casos confirmados de Oropouche nas Américas. Casos confirmados foram relatados em seis países: Brasil (3.678), Canadá (1 importado), Cuba (4), Guiana (1), Panamá (79) e Peru (2).

 

A Febre do Oropouche no Brasil

A partir de 2023, houve aumento significativo na detecção de casos de Oropouche no Brasil. Ao longo do ano, 834 amostras tiveram diagnóstico confirmado para o vírus Oropouche (OROV).

Em 2024, observou-se uma expansão da circulação viral para estados extra-amazônicos, com um total de 13.856 amostras positivas registradas até a semana epidemiológica (SE) 50. A transmissão autóctone (teve sua origem no mesmo local de residência do indivíduo) foi identificada em quase todas as unidades federativas, com exceção do Rio Grande do Norte, Goiás, Distrito Federal, Paraná e Rio Grande do Sul.

Já em 2025, até a semana epidemiológica 23 (maio), o Ministério da Saúde contabilizou 11.565 casos confirmados, com 4 óbitos confirmados e 3 sob investigação.


Rio de Janeiro:

Em maio de 2024, o Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) confirmou o diagnóstico de febre Oropouche em um paciente do Rio de Janeiro com histórico de viagem para Manaus. A confirmação laboratorial foi realizada pelo Laboratório de Arbovírus e Vírus Hemorrágicos do IOC, que atua como Laboratório de Referência Regional para Arbovírus junto ao Ministério da Saúde. 

Segundo dados epidemiológicos do Ministério da Saúde, em 2024 o Estado confirmou 163 casos da doença.  Já em 2025, até a semana 22, foram 2.364, sendo 02 óbitos em investigação e 03 óbitos confirmados.

No município de Niterói foram 02 casos confirmados da doença em 2024; já em 2025, 06 casos até a semana epidemiológica 22 (maio).


Veja também:

Arboviroses Emergentes: FEBRE DO OROPOUCHE


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Fontes:

Ministério da Saúde

Ministério da Saúde - Painel Epidemiológico

Ministério da Saúde - Nota Técnica Oropouche 2024

CIEVES-RJ Centro de Informação Epidemiológicas de Vigilância em Saúde do Estado do Rio de Janeiro

Agencia Gov

Organização Mundial da Saúde

IOC/FIOCRUZ

IOC/FIOCRUZ matéria


Fontes das imagens:

Ministério da Saúde

Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Albert Einstein



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